quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Eu assisti: Que horas ela Volta?




Eu sou apaixonado pelo o cinema nacional e, por ter visto vários filmes do segmento, constatei que grande parte deles retratam a realidade do nosso país - logicamente, estou excluindo dessa lista as comédias, que ocupam um espaço gigantesco nas salas.

A princípio, percebi que muito se falava (e fala) sobre o "Que horas ela volta?" e confesso que mesmo sendo elogiado por boa parte dos críticos, esperava encontrar um drama pesado.



Mas ainda bem que tive essa expectativa quebrada. Fui apresentado à Val, que é deliciosamente interpretada por Regina Casé. 

A premissa é relativamente simples. Val tomou a decisão de deixar a sua filha, Jéssica, sendo criada por outra pessoa em sua terra natal (Pernambuco) e, com o intuito de proporcionar uma vida melhor a ela, mudou-se para São Paulo. Lá, ela trabalha como empregada doméstica para Bárbara (Karine Teles) e Carlos (Lourenço Mutarelli).

"Que horas ela volta" logo no começo já dita o tom da relação entre Val e Fabinho (Michel Joelsas), que é bem mais intenso do que a que ele tem com a sua mãe - muito frequente entre domésticas e filhos de patroas. O assunto da terceirização da maternidade é tocado em várias partes do filme de maneira muito eficaz e sem ser melodramática.




Perto do vestibular da maior faculdade de arquitetura do Brasil: a FAU, Jéssica pede para ficar na casa da mãe apenas para fazer a prova. Val, enxerga neste pedido a oportunidade de estreitar o relacionamento com a sua filha.

Ao chegar de viagem, ela se depara com uma realidade na qual não acredita: sua mãe mora no serviço e, quando ela conhece a dita "família", nota-se que não concorda com a forma que a Val é tratada ali como uma cidadã de segunda classe. 


Surge então um conflito que escancara as diferentes formas de pensar dessas mulheres. Se por um lado temos a postura submissa e conformista da doméstica que nasceu sabendo o seu lugar. Por outro, temos uma jovem questionadora que tenta a todo custo se nivelar socialmente, não admitindo ser tratada como inferior. Não poderia deixar mencionar o despreparo da socialyte em lidar com as pessoas que subiram um degrau social e conseguem ter acesso a muito mais recursos do que as gerações anteriores.




Outro problema interessante é a depressão que o arquiteto Carlos passa, explicitando a artificialidade daquela organização familiar. Ele acaba se identificando com a jovem, tanto por ela querer seguir a área que ele trabalha, quanto por suas ideias visionárias. 

Inclusive é interessante o contraponto da patroa que se incomoda com essa pequena revolução provocada dentro de sua casa.

O legal de tudo é que o filme acerta na simplicidade e na leveza. Primeiro, por conta da atuação divertida e real de Casé, que constrói um humor nada caricato. Depois, temos a dinâmica dos diálogos e gestos sutis entre a doméstica e os patrões. Trata-se de uma forma educada de humilhar a pessoa.

Na tradicional frase "Ela  é praticamente da família"  , onde esse  "praticamente"  tem o poder de definir que seu lugar é da cozinha para os fundos.


Em termos técnicos não sou especialista, mas posso dizer que tudo ali tem uma função. O silêncio em muitos momentos, nos induz a refletir. Os cenários, os figurinos e até mesmo os objetos tem significados específicos nas cenas e ajudam a contar melhor a história (vide piscina, jogo de xícaras, a bandeja antiga, entre outros).
A trilha sonora, caracteriza e mostra os gostos dos personagens. A própria escolha na posição das câmeras, como a de, inicialmente, concentrar as tomadas a partir da cozinha e das áreas de serviço, mostrando o mundo da Val. Depois, expandindo o espaço físico à medida que a Jéssica explora os outros cômodos da casa. 

Eu poderia escrever um texto imenso marcando pontos que gostei, mas por hora quero só indicar esse filme maravilhoso que espero que trague ainda mais prêmios para o Brasil.



E você? Já assistiu? Se sim comente abaixo o que achou.

Até a próxima pessoal.

15 comentários:

  1. Adorei sua resenha do filme. Parece ser bastante reflexivo.
    Quero ver a Regina Cazé atuando de uma forma diferente.
    Te marquei em uma tag, depois dê uma olhada.

    http://jj-jovemjornalista.blogspot.com.br/

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    1. Espero que você também goste, a mensagem do filme é linda.

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  2. Já ouvi falar muito sobre esse filme. Cada comentário me instiga ainda mais. Confesso que eu não imaginava que iria ser um filme com grande teor critico, como você disse. Gostei muito de sua resenha do filme.

    Decidindo-se \o/

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    1. Obrigado espero que tenha oportunidade de assisti-lo.

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  3. Olá Beto,

    Assim como você sou viciadinha em filmes nacionais e andei assistindo uns bons outro dia, depois te passo.

    Este filme todos deveriam assistir e mostra bem a realidade da população brasileira. As pessoas apenas seguem o fluxo da sociedade, onde o pai de família se encanta pela jovem por ela gostar de arquitetura, a esposa que gosta de gradar a todos e vive um vida de aparências e o filho que considera Val como mãe, mas na verdade exclui ela da sociedade.

    Um beijo,

    www.alicetwins.blogspot.com.br
    www.purestyle.com.br

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    1. Que legal! Achei mais alguém que gosta de filmes nacionais hehe. Eu vi análises bem mais profissionais na Internet e é incrível como esse simples filme abre uma imensa Gama de discussões.

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  4. Ola´, tudo bem?
    Vou ser sincero, não sou muito fã do cinema nacional, mas existe algumas exceções. Acredito que esse filme deve ser uma delas. Gosto muito do trabalho da Regina Casé como atriz, e já ouvi muitos falando muito bem sobre a obra, assim como você.
    Pretendo ver. Até mais. http://realidadecaotica.blogspot.com.br/

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  5. Oi Beto!
    Não assisti porque não é bem meu tipo de filme (na verdade, tenho assistido pouquíssimos filmes ultimamente, então estou escolhendo a dedo aqueles que me interessam muito, sabe?) Que bom que você gostou tanto.
    Beijos,
    alemdacontracapa.blogpsot.com

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  6. Quando um filme não é nossa praia fica de difícil de gostar. Quem sabe um dia você se anime de assisti lo. Obrigado pela a visita :)

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  7. Esses tempos tenhl visto mais filmes antigos, mas esse tem que entrar na minha lista quando eu tiver um tempo, justamente por esse teor crítico que vem cutucar uma sociedade que insiste em ser contra às mudanças e diminuição das disparidades sociais.
    Ótimo.comentário, me fez sentir mais vontade de ver o filme.
    beijos.

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    1. Assista Lu, é um filme bem sutil e reflexivo. Espero que goste da temática.
      Beijos,
      Obrigado pela a visita

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  8. Muito bom a sua resenha, parece ser um filme legal. Já ouvi muito sobre ele, pretendo assistir.

    " Na tradicional frase "Ela é praticamente da família" , onde esse "praticamente" tem o poder de definir que seu lugar é da cozinha para os fundos. "

    Gostei do que você disse, nunca tinha pensado nisso.

    http://letrasfloresecores.blogspot.com.br/

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    1. Obrigado pela a visita, assista sim e depois me conte o que achou.hehe

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  9. Olá, Beto.
    Adorei a tag e a indicação de filme. Vou conferir o mais breve possível!
    Até mais. http://realidadecaotica.blogspot.com.br/

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