segunda-feira, 15 de setembro de 2025

Transmutando a Bad em Joy: Todos por uma saúde mental de qualidade

                     


          A adolescência sempre foi marcada por transformações intensas, mas nas últimas décadas esse processo parece ter ganhado contornos ainda mais desafiadores. A chamada “bad”, expressão popularizada para nomear estados de tristeza, angústia, vazio ou confusão, tornou-se parte do vocabulário cotidiano de jovens que muitas vezes não encontram outras formas de expressar o que sentem. Essa experiência não é apenas uma moda passageira, mas um reflexo de realidades emocionais que atravessam o desenvolvimento psíquico e social.






        Nos artigos anteriores desta série, discutimos como a bad se inscreve na cultura e como ela pode ser compreendida como parte da experiência humana. Agora, avançamos para um ponto crucial: a regulação emocional. Como os adolescentes podem aprender a lidar com suas emoções de maneira saudável? De que forma pais, responsáveis, educadores e a sociedade como um todo podem colaborar nesse processo? E, sobretudo, como compreender que regular emoções não significa eliminá-las, mas sim criar espaço interno para senti-las sem que elas se tornem paralisantes?


        Este artigo propõe um mergulho em práticas de regulação emocional que podem ser aplicadas tanto em contextos pedagógicos quanto familiares, ampliando a compreensão da bad como experiência coletiva e multigeracional. Afinal, a regulação emocional é uma necessidade não apenas dos adolescentes, mas também dos adultos que os cercam, pois só assim é possível construir relações mais saudáveis e ambientes que favoreçam o crescimento.





 Adolescência: território de intensidades






        A adolescência é um período da vida em que o corpo e o cérebro passam por mudanças significativas. Do ponto de vista neurológico, áreas ligadas ao prazer, recompensa e impulsividade se desenvolvem mais rapidamente do que as regiões responsáveis pelo autocontrole e pela tomada de decisões ponderadas. Isso explica, em parte, a intensidade das emoções adolescentes e a dificuldade em lidar com frustrações ou estados de humor oscilantes.


Culturalmente, vivemos em um tempo em que adolescentes são constantemente expostos a fluxos de informação, comparações sociais e expectativas irreais de desempenho, beleza e felicidade. As redes sociais amplificam emoções, criando a sensação de que todos vivem vidas mais interessantes, o que potencializa sentimentos de inadequação.




        A “bad”, nesse cenário, funciona como um rótulo acessível para descrever experiências complexas de sofrimento, mas também como um pedido de ajuda indireto. O desafio é transformar essa experiência em um ponto de partida para práticas de autorregulação, autoconhecimento e fortalecimento de vínculos.








 Práticas pedagógicas de regulação emocional 



        A escola é um espaço privilegiado para promover estratégias de cuidado. Muitas vezes, adolescentes encontram nos professores e colegas um campo de escuta que não se estabelece em casa. A seguir, alguns exemplos práticos que podem ser aplicados em sala de aula ou em projetos pedagógicos.






1. Roda de escuta e expressão criativa 




        Uma prática simples é reservar semanalmente alguns minutos para que os alunos possam expressar como estão se sentindo. Isso pode ser feito por meio de cartões de cores (cada cor representando uma emoção), palavras escritas em um mural ou pequenas falas voluntárias. O objetivo não é resolver os problemas imediatamente, mas normalizar a ideia de que emoções fazem parte da vida escolar.

        A normalização da expressão emocional precisa ocorrer em sala de aula para que os alunos sintam-se confortáveis em relatar conflitos internos ou com outros colegas e, saibam sinalizar quando entram em estado de crise emocional.

        Ter essa consciência, ajuda a identificar e/ou até mesmo prevenir conflitos de tal modo que o aluno passa a se conhecer mais, consequentemente consolidando a escola como também um espaço de edificação da identidade emocional.




 2. Diário emocional 


        Professores podem propor que os estudantes mantenham um caderno de anotações semanais, no qual registrem momentos de alegria, tristeza, frustração e conquistas. Posteriormente, esses registros podem ser usados em atividades de redação, artes visuais ou até mesmo em matemática (transformando emoções em gráficos de intensidade, por exemplo).



        O diário emocional trás benefícios como uma prática terapêutica de expressão e também auxilia no desenvolvimento da criatividade artística. A externalização das emoções é essencial para que os jovens saibam para onde direcionar as suas dores e angústias. Do ponto de vista educacional, telentos artísticos podem ser identificados ali e a escola também terá a possibilidade de promover concursos e atividades que visam a criação de conteúdos de apoio coletivo. Assim, forma-se naturalmente também uma rede de apoio terapêutico, já percebe-se que passar por questões emocionais profundas é algo que pode acontecer com qualquer pessoa. 



3. Técnicas de respiração em sala 


        Antes de provas ou atividades estressantes, exercícios rápidos de respiração consciente podem ajudar a reduzir a ansiedade. Por exemplo: inspirar contando até quatro, segurar o ar por quatro segundos e expirar contando até quatro. Outra técnica eficaz é o “5-4-3-2-1”, em que o estudante identifica cinco coisas que vê, quatro que sente ao toque, três que ouve, duas que cheira e uma que prova mentalmente.

        Práticas de resgate para o momento presente mostram-se essenciais por auxiliar os jovens a saírem de um estado de pânico e de pensamentos acelerados. São essenciais para que eles aprendam de forma simples a se cuidarem emocionalmente e os preparam para situações mais estressoras da vida adulta.




4. Projetos interdisciplinares



        A bad pode ser abordada de maneira transversal: em literatura, analisando personagens que lidam com angústia; em história, discutindo movimentos sociais como expressões de insatisfação coletiva; em artes, promovendo oficinas de pintura, música ou teatro como formas de canalizar emoções. 




Atividades para a família







        A regulação emocional não se restringe ao ambiente escolar. O lar é o espaço mais imediato de acolhimento, e pequenas práticas podem transformar a dinâmica familiar.


 1. A hora do check-in emocional 


Estabelecer um momento do dia (no jantar, por exemplo) para que cada membro da família diga como está se sentindo. Não se trata de resolver os problemas de imediato, mas de cultivar um hábito de escuta.


 2. A prática do silêncio compartilhado


Muitas vezes, pais e adolescentes se afastam porque um não sabe como falar com o outro. Propor momentos curtos de silêncio em conjunto, seja numa caminhada, seja ao cuidar de plantas ou cozinhar, pode criar uma sensação de conexão sem a pressão da palavra.


3. Caixa de recursos emocionais


A família pode construir uma caixa com objetos que ajudem na autorregulação: bolas antiestresse, papéis para escrever desabafos, fotos de momentos felizes, playlists calmantes. Quando alguém estiver em uma bad, pode recorrer a esse recurso como forma de lembrar que existem estratégias disponíveis.


4. Revezamento de responsabilidades


Muitas bads adolescentes têm relação com a sensação de impotência. Atribuir pequenas responsabilidades domésticas (como cozinhar um prato, organizar uma parte da casa ou cuidar de um animal) contribui para o fortalecimento da autoestima.



Dicas para pais


Cuidar de adolescentes é desafiador porque o impulso de controlar ou corrigir pode sufocar a autonomia necessária para o desenvolvimento. Algumas orientações práticas incluem:


Validar emoções: em vez de dizer “isso é besteira”, afirmar “entendo que isso esteja sendo difícil para você”.

Modelar comportamentos saudáveis: mostrar como lida com frustrações no cotidiano. Se o adulto explode diante de um problema, transmite a ideia de que essa é a única forma possível. 

Evitar comparações:cada adolescente tem seu tempo. Comparações com irmãos, colegas ou até mesmo com a própria juventude dos pais geram frustração.

Criar espaços de confiança:não transformar cada desabafo em sermão. Às vezes, o jovem só precisa ser ouvido.

Reconhecer limites:se a bad ultrapassa o cotidiano e se transforma em sofrimento prolongado, é essencial buscar ajuda profissional.


 Regulação emocional também para adultos


            Um ponto essencial é compreender que adolescentes não aprendem a regular emoções apenas com técnicas ensinadas diretamente, mas sobretudo ao observar como os adultos ao seu redor lidam com a vida. Isso significa que pais, professores e cuidadores também precisam cuidar de si mesmos.


 Práticas úteis para adultos





1. Respiração consciente no cotidiano: antes de reagir a uma situação de conflito, fazer três respirações profundas já ajuda a mudar a resposta automática.

2. Ritual de fechamento do dia: escrever brevemente o que deu certo e o que foi difícil antes de dormir, evitando levar preocupações não processadas para o sono.

3. Cuidado com o corpo: sono regulado, alimentação equilibrada e atividade física são pilares que impactam diretamente a saúde emocional.

4. Redes de apoio: adultos também precisam compartilhar suas dificuldades. Conversar com amigos, grupos de apoio ou terapeutas cria modelos positivos para os adolescentes.

5. Prática da compaixão consigo mesmo:reconhecer que erros fazem parte e que não é preciso ser perfeito para ser um bom exemplo.


 Transformando a regulação em hábito


        A grande dificuldade não está em conhecer técnicas, mas em torná-las parte da vida cotidiana. Tanto na escola quanto em casa, é importante que as práticas sejam simples, acessíveis e repetidas até que se tornem naturais. Pequenas rotinas diárias, como iniciar a aula com um minuto de silêncio ou encerrar o jantar com uma palavra de gratidão, criam uma cultura de cuidado.


        A regulação emocional, assim, não deve ser encarada como mais uma obrigação ou regra imposta, mas como um estilo de vida coletivo que valoriza a escuta, o respeito e a expressão saudável das emoções.



        “Muita bad pra pouca idade” não é apenas uma frase de impacto, mas a realidade de muitos adolescentes que se veem sobrecarregados por emoções intensas e por contextos sociais que nem sempre oferecem suporte. A proposta deste artigo é mostrar que a bad pode ser atravessada por meio de práticas simples e consistentes, aplicáveis tanto na escola quanto na família, e que dependem de adultos dispostos a também cuidar de si mesmos.


        A regulação emocional é uma aprendizagem coletiva e contínua. Não se trata de eliminar a tristeza, a raiva ou o medo, mas de criar caminhos para que essas emoções não se tornem prisões. Ao reconhecer que adolescentes, pais e professores estão juntos nesse processo, abre-se a possibilidade de uma cultura emocional mais saudável, em que a bad deixa de ser apenas um peso e passa a ser uma oportunidade de amadurecimento.


        Sendo assim, reconhece-se a importância de sentir a "Bad" e encará-la como travessia. Emoções são importantes para que todos possam reconhecer situações que fazem bem ou não. A transmutação dela em "Joy" permite reconhecer que assim como a natureza passa por estações as pessoas passam por fases e estados emocionais. Evita-se a criação da positividade tóxica, também conscientiza a população de que está tudo se você não está bem. Que na realidade, não estar bem é normal. Apenas deve ter o cuidado para episódios de "Bads" prolongadas. Portanto, não é possível viver em estado de "Joy" o tempo todo e que na vida, o importante é tirar as melhores lições de cada fase.





Esperamos que artigo tenha ressignificado a "Bad" para vocês, queridos leitores.





Desejamos uma vida bem "Joy" para vocês.

Enjoyem-se!


Estejam em peace!


Artigos complementares:

Viva Bem: Uol - Família em movimento: conheça atividades para fazer com os seus filhos


 Referências

DAMÁSIO, Antonio. O erro de Descartes: emoção, razão e o cérebro humano. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.

GOLEMAN, Daniel. Inteligência emocional: a teoria revolucionária que redefine o que é ser inteligente. Rio de Janeiro: Objetiva, 1995.

MATURANA, Humberto; VARELA, Francisco. A árvore do conhecimento: as bases biológicas do entendimento humano. Campinas: Psy II, 2001.

SIEGEL, Daniel J. Cérebro adolescente: o guia de sobrevivência para entender o que se passa na mente dos jovens. Porto Alegre: Artmed, 2014.

WINNICOTT, Donald. O ambiente e os processos de maturação. Porto Alegre: Artmed, 1983.





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